Histórias de Larinha Ela dormiu na cama da minha mãe a acabou fazendo xixi nas calças. O combinado é que cada vez que ela faz xixi dormindo é ficar sem brincar com um brinquedo. Para ter de volta o brinquedo confiscado, ela tem que usar o banheiro direitinho por três vezes seguidas. Para se ver livre do confisco do brinquedo, tentou se justificar com a mãe:
- Eu mijei na cama da vó, mas a culpa foi dela que não me acordou pra ir ao banheiro.
Não colou.
*** Para as crianças de hoje em dia, não basta dizer que “não” você tem que explicar porque e manter atitudes coerentes. Levei Larinha à praia e fiz um rabo de cavalo nela pro cabelo não embaraçar com o vento. Eu mesma estava com os meus cabelos presos por isso. Ela queria desfazer o penteado.
- Não solta o cabelo, Larinha. - Por que? - Porque eu não trouxe pente. Aí, você vai soltar o cabelo, ele vai ficar todo embolado e você vai ficar feia.
Ela me pediu três vezes pra soltar o cabelo e eu sempre dizia que não. Ela me obedeceu, mas foi só a gente entrar no carro e ela me vir soltando o meu cabelo pra reclamar:
- Você é engraçada, madrinha, falou pra eu não soltar meu cabelo e está soltando o seu.
Eu tive que dar explicações para um menina de 5 anos.
- É que a piranha fica batendo no encosto de cabeça e machuca. Se você quiser, pode soltar o seu agora também.
Na mesma hora, ela tirou o elástico da cabeça.
**** Larinha tem o álbum de Carros. Ela adora o Mate (“Aqueles dentinhos...”). Comprei cinco envelopes para ela. Ela não estava em casa e mãe ligou para ela para contar.
- Mãe, você abre os envelopes, cola as figurinhas que eu não tiver, pega as que eu tenho e troca com o J (amigo dela que também coleciona o álbum).
Só isso? Fritas acompanha? A mãe tenta explicar que a graça de ter um álbum de figurinhas é justamente, abrir os envelopes, colar as figurinhas no álbum, trocar as repetidas... Mas a bichinha é mais prática.
Eu e a minha bunda, digo, boca grande Esqueci que não estava entre amigos e em uma discussão informal com meus novos colegas de trabalho, soltei uma expressão já corriqueira para mim, mas que sempre causa espanto, quando escutada pela primeira vez.
- Dou meu cu na rifa como isso não aconteceu!
Me arrependi de dizer isso na frente de quem mal conheço, mas não tinha como voltar atrás. Todo mundo riu, uns meio chocados, mas um colega, não deixou a bola quicar e me devolveu, com seu sotaque de Sergipe:
- Meu número é sete. Anote aí. Sete é meu número da sorte.
Por falar em Escorpião... Já que não anda necessariamente chovendo na minha horta (e tb qnd chove, ao invés de eu me deixar encharcar, abro logo meu guarda-chuva, ponho galocha, capa...), apelei para os astros para saber com que nativos os escorpianos se relacionam bem (sic). São os cancerianos e os piscianos. Segundo o site Estrela Guia, o relacionamento amoroso de Escorpião e Câncer “é uma das melhores combinações do zodíaco”*. Ui!
Então, estão todos avisados: quem souber de um canceriano sem compromisso de namoro, noivado, casamento ou enrolação pode me apresentar.
* Por acaso, a "última chuva" que regou minha horta era do signo de Câncer. O site deve estar certo.
Isso é uma esculhambação! Já não bastava os nativos de Escorpião carregarem a pecha de serem invejosos, inflexíveis, possessivos, rancorosos, vingativos, intransigentes, enfim, de serem do pior signo do Zodíaco ainda são sacaneados com o rebaixamento do seu planeta regente à categoria de planeta-anão. Depois querem que sejamos bonzinhos, educados, gentis... Tomá no cu todo mundo!
“Maria estava na porta, olhano para mim, se rindo, toda vestida de preto. Olhem: eu sei que a gente exagera em amor, não insisto.Mas se já tive a sensação da vontade de Deus, foi ver Maria assim, toda de preto vestida, fantasticamente mulher. Meu corpo soluçou todiho e tornei a ficar estarrecido.
- Ao menos diga boa noite, Juca...
“Boa noite, Maria, eu vou-me embora”... Meu desejo era fugir, era ficar e ela ficar mas, sim, sem que nos tocássemos siquer. Eu sei, eu juro que sei que ela estava se entregando a mim, me prometendo tudo, me cedendo tudo quanto eu queria, naquele se deixar olhar, sorrindo leve, mãos unidas, caindo na frente do corpo, toda vestida de preto. Um segundo, me passou na visão devorá-la numa hora estilhaçada de quarto de hotel, foi horrível. Porém, não havia dúvida: Maria despertava em mim os instintos da perfeição. Balbuciei afinal um boa-noite muito indiferente, e as vozes amontoadas vinham do hol, dos outros que chegavam.
Foi este o primeiro dos quatro amores eternos que fazem da minha vida uma grave condensação interior. Sou falsamente um solitário. Quatro amores me acompanham, cuidam de mim, vêm conversar comigo. Nunca mais vi Maria, que ficou pelas Europas, divorciada afinal, hoje dizem que vivendo com um austríaco interessado em feiras internacionais.Um aventureiro qualquer. Mas dentro de mim, Maria... bom: acho que vou falar banalidade.”
Fragmento do conto Vestida de Preto, de Mario de Andrade, que li em 1991 e nunca mais esqueci.
"Pedimos pelo amor de Deus que o telefone toque e que a partir deste toque um novo capítulo comece a ser escrito na nossa história. Fingimos que somos seres altamente erotizados e, na hora H, amarelamos. Depositamos todas as nossas fichas amorosas em pessoas que não conhecemos senão virtualmente. Disfarçamos nosso abandono com frases ousadas e sem verdade alguma. O que a gente gostaria de dizer, mesmo, é: me dê sua mão.”
Negritude Em uma roda de conversa, falávamos sobre etnia e um rapaz negro (não um negão de dar gosto, mas um nescauzinho feito com leite desnatado, tipo o Vicente) disse que cada um tem a cor que declara ter e ele se declara negro. Uma menina, branca, cabelo castanho bem claro, olhos claros também, disse:
- Eu também. Se me perguntarem, eu digo que sou negra.
Eu me abstive de comentários, mas é muito fácil se dizer negra quando se tem a pele alva, os olhos claros, quando se é criada em apartamento com carpete na Zona Sul. Eu fui criada em casa de fundos no subúrbio, tenho o cabelo quase azul de tão preto, mas não me acho no direito de dizer que sou negra. Não sou. Embora admire muito a cultura negra, a mitologia africana e até o “lay out” dos negros, com suas tranças, seus dentes muito claros e sua pele sem rugas, isso não faz de mim uma negra. Nunca sofri na pele (perdão pelo trocadilho) o preconceito racial. Nunca fui parada em blitz. Quando entro no ônibus, ninguém me segue com o olhar pra ver onde vou sentar. Nunca fui a única da minha “cor” na sala de aula. Claro que se eu revirar minha árvore genealógica vou achar algum negro nela, mas até onde eu me sei, meus ancestrais são brancos. Por que vou me declarar negra? Só porque gosto de samba e danço direitinho? Só porque sou chegada num negão? Só porque tenho uma camisa com estampa de Iansã e tenho vontade de aprender Iorubá? Só porque sou solidária à luta dos negros? Acho que não.
Fotos de férias Depois do advento da câmera digital, nenhum álbum de férias tem menos de cem fotos, mesmo que o registro seja de um único final de semana na casa de Guaratiba empresta por parentes. Sobra pra gente que tem que ficar sentada na frente do computador vendo um monte de foto repetida, outras fora de foco, um divertimento só.
Meus primos ficaram 7 dias em Fortaleza e voltaram com mais de 750 fotos. Mais de 100 fotos por dia. O final de semana em família era a oportunidade que faltava para vermos todos juntos as recordações da viagem. Entre várias fotos lindas e outras nem tanto, aparece uma foto deles na praia com minha prima, um tanto gorda, em primeiro plano. Aliás, era sua barriga que estava em primeiríssimo plano. Seu irmão não perdeu a oportunidade:
- Ih, um buda.
Como se ele mesmo não se assemelhasse a um. E a prima mais nova emenda:
- Tinha que estar de costas pra dar sorte.
De outra vez minha madrinha via fotos de uma viagem destes mesmos primos e não reconheceu meu primo em pé na praia:
- Quem é esta mulher de topless???
Acho que ano que vem eles não vão levar máquina fotográfica pra viagem de férias.
Sono revelador Minha prima mais nova contou pro pai que saiu na noite anterior e experimentou tequila. Aí, ela foi dormir. Ao acordar, voltou a conversar com o pai e disse que tinha tomado Sol, a cerveja mexicana. E ele:
- Minha filha, antes de dormir você falou que bebeu tequila. Agora que acordou veio me contar que bebeu Sol... Vai dormir que, de repente, quando acordar você me conta mais coisa.
Surrasco em Ponta Negra Este final de semana foi aquele de fazer a caridade de ir com a família para Ponta Negra. Caridade mesmo porque eu que fui dirigindo. Mas claro que o combustível foi Ursulão quem bancou. Mandei uma letra de que não tinha dinheiro, o que não é lá muita mentira. Foi combustível de um posto sem bandeira, mas “a cavalo dado não se olha os dentes”, né?
Test drive Hoje eu dirigi o carro que vou comprar em 2008: um Celta 2006, 1.4, preto, quatro portas, completo. Achei o painel simplesinho. Meu primo, atual dono, disse que é mesmo; é quase uma moto. O único senão é o espaço apertado dos pedais, mas com tempo eu me acostumo. Eu não me acostumei com o câmbio e a direção duríssimos do Palio? Então, vai ser moleza me acostumar com o espaço (ou a falta de) do Celta.
Pais e filhas Cheguei na sala com a entrevista de Ferreira Gullar por Roberto D’Ávila já iniciada e pergunto a meu pai: - De que poema eles estão falando? - De Poema Sujo. (pausa) Tem aí (aponta pra estante).
(Eu sei. Eu via você lendo quando era criança e por isso eu mesma já o li.)
Depois de assistir Conexão Roberto D’Ávila com Ferreira Gullar Eu queria bater um papo com Ferreira Gullar com todos os seus “Não é?” e “Tá entendendo?”.
Psicologia infantil Tudo bem que eu fui criada ouvindo histórias do Bicho Pandeiro (que quando andava fazia squitum-squitum), mas assustar o filho dizendo que o monstro dentuço e a diarista cega podem pegá-lo, como Aloysio faz, é sacanagem.
Cora Ronái Eu raramente leio a coluna da Cora (tanto que hoje li pensando que era a do Arnaldo Bloch. Só vi que o texto era dela quando terminei de lê-lo.), mas concordo com tudo que ela escreveu sobre Zuzu Angel. Não vou nem me dar ao trabalho de emitir minha opinião. O link pra coluna dela já basta.